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É verdade que Lev Tolstói era anarquista?
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Lev Tolstói nunca reconhecia nenhuma autoridade e tampouco tinha medo delas. O grande escritor russo denunciava e criticava o governo russo e a Igreja Ortodoxa. Os seguidores do escritor foram presos e exilados, seus livros e artigos foram proibidos (por exemplo, "Sonata a Kreutzer", "Cristianismo e Patriotismo”, “No que eu acredito”).
Mas ninguém se atreveu a punir o escritor. Apenas no final da sua vida, em 1901, ele foi excomungado da Igreja Ortodoxa Russa, mas o anátema não foi cantado em nenhuma igreja.
Contra qualquer violência
Durante sua longa vida, Tolstói repensou várias vezes os problemas do poder humano, do Estado e de como eles se combinam com a moralidade. Ele condenava qualquer tipo de violência, um dos princípios de sua filosofia no final da vida era "não resistir ao mal pela violência".
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Assim, suas ideias estavam próximas daquelas dos pensadores orientais e do taoísmo, mas também do cristianismo. Os princípios formulados por Tolstói inspiraram Mahatma Gandhi, que o conheceu pessoalmente. Foi com Tolstoi, segundo Gandhi, que ele descobriu o "satyagraha", ou seja, a desobediência civil não violenta, ou a "resistência passiva".
Tolstói tinha uma opinião negativa sobre o governo do Império Russo, mas também odiava os Estados ocidentais. Toda a história da Europa, segundo Tolstoi, era a história de governantes estúpidos e depravados, que "matavam, arruinavam e, o mais importante, corrompiam seu povo".
"Não importa quem assuma o trono, a mesma coisa se repete: morte e violência contra as pessoas. Isso acontece em todos os Estados e repúblicas constitucionais pretensamente livres", escreveu Tolstói.
Se os governantes fossem pessoas boas e altamente morais, seria possível justificar a subordinação de todo o povo a eles. No entanto, de acordo com Tolstói, eram sempre “pessoas más, insignificantes, cruéis, imorais e, o mais importante, enganosas” - como se todas essas qualidades fossem uma condição necessária para tomar o poder.
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No artigo "Sobre o poder do Estado" Tolstói coloca no mesmo nível "o perverso Henrique 8", "o vilão Cromwell" e "o hipócrita Carlos 1°". O escritor descreveu de maneira rude os tsares e imperadores russos também, chamando Ivan, o Terrível, de “doente mental”, Catarina, a Grande, de “alemã de comportamento desonesto e dissoluto” e Nicolau 2º de “oficial hussardo tolo”.
Estado é pura maldade
Tolstói percebe toda a história dos povos cristãos europeus, desde a época da Reforma Europeia, como "uma lista contínua dos crimes mais terríveis e insensatamente cruéis cometidos por pessoas do governo contra seus próprios povos, povos estrangeiros e uns contra os outros".
Tolstói considera o Estado um ladrão que rouba o direito de usar uma terra de pessoas que nasceram naquela mesma terra. As pessoas, assim, são forçadas a pagar pelo direito de estar na sua terra natal, "pagar com trabalho e dinheiro simplesmente para viver". O Estado protege esse roubo como seu direito sagrado.
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Segundo Tolstói, a violência contra crianças começava com o nascimento, quando elas eram batizadas em determinada religião ou enviadas para uma escola onde lhes era ensinado que o governo de seu país era o melhor, não importava "se é o governo do tsar russo, do sultão turco, do Chamberlain inglês com sua política colonial, ou dos Estados Norte-Americanos com seu patrocínio de trustes e imperialismo”.
Assim, Tolstói chega à seguinte conclusão: “a atividade de qualquer governo é uma série de crimes”.
Renúncia a qualquer poder é a única saída
A pessoa que é guiada em sua vida pelos ideais da razão e do bem deve logicamente renunciar a qualquer violência, deixar de apoiá-la. Mas as pessoas apenas modificam a violência. Assim, Tolstói acreditava que qualquer Estado devia simplesmente desaparecer. Mas como manter a ordem?
O escritor via uma saída na religião, nos valores morais, na fé e na filantropia. Em sua opinião, se uma pessoa era moral, não era necessário aplicar violência, o principal método de qualquer sistema estatal.
“Os povos da Europa passaram de um Estado inferior a um Estado superior quando aceitaram o cristianismo; os árabes e os turcos também avançaram para o mais alto grau de desenvolvimento após se tornar maometanos, e os povos da Ásia, adotando o budismo, o confucionismo ou o taoísmo”, escreveu.
No entanto, a fé cristã moderna também parecia fraca para Tolstói. Durante o último milênio, ela tinha absorvido, segundo ele, vários "absurdos" e parado de ensinar comportamento, "exceto em relação a uma fé cega e obediência àqueles que se autodenominam Igreja". A igreja moderna, assim, ocuparia o lugar que a verdadeira religião deveria ocupar, dando às pessoas uma explicação do sentido da vida, segundo segundo escreveu Tolstói.
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