Como Napoleão encheu a Rússia de dinheiro falso

Em sua obra-prima "Guerra e Paz" o escritor russo Lev Tolstói  escreveu que Napoleão ordenou que “fossem levadas notas russas falsificadas para a Rússia o mais rápido possível”. Não se trata de invenção: o imperador francês realmente tinha o costume de usar essa tática. Antes da invasão do Império Russo, por exemplo, ele ordenou cunhar moedas prussianas e imprimir notas inglesas e austríacas.

Reza a lenda que foi uma gráfica parisiense dirigida pelo irmão do assistente de Napoleão, Monsieur Fen, que começou a imprimir dinheiro russo falsificado pouco antes da invasão. As formas de impressão foram preparadas pelo gravador Lall. Após a impressão, as notas falsas foram jogadas no chão sujo e amassadas, para que parecesse que o dinheiro estava em circulação havia muito tempo.

"Napoleão em 1806", de Jean Baptiste Édouard Detaille.

Trinta e quatro carruagens com notas falsas entraram na Rússia junto com o exército de Napoleão. Os franceses planejavam usar esse dinheiro para pagar alimentação e moradia e estavam prontos para imprimir novas falsificações em uma prensa móvel.

Qualidade alta demais

Somente pessoas muito atentas entendiam que as notas dos franceses eram falsas. Em geral, elas eram de melhor qualidade  que as notas russas originais. Os papéis das notas falsas tinham uma elegante tonalidade azul e elas foram impressas em equipamentos mais modernos. O texto, os relevos e as marcas d'água eram de qualidade muito elevada.

"Napoleonovkas", as notas napoleônicas falsificadas.

Além disso, os falsificadores erraram nas assinaturas. Eles não sabiam russo e nem perceberam a confusão nas letras. Em vez do nome "Spiridon", por exemplo, eles escreveram "Spiridot", e em vários lugares a letra “Л” (que soa como “L”) foi confundida com a letra “Д” (que soa como “D”).

"Napoleonovkas", as notas napoleônicas falsificadas.

Os oficiais do exército francês recebiam seus salários em notas falsificadas e tentavam se livrar deles o mais rápido possível, trocando-os por ouro e prata. Os franceses abriram lojas de câmbio em Moscou, onde vendiam notas de cinco rublos por um rublo de prata.

Os rublos em papel haviam sido afetados pelas flutuações do mercado financeiro ainda antes da chegada de Napoleão. Em 1797, uma nota de um rublo era trocada por 0,755 rublos em prata. O imperador russo Paulo 1º chegou a ordenar que destruíssem todo o estoque existente de moeda em papel, cerca de 5 milhões de rublos foram queimados. Isso, porém, não ajudou a conter a inflação e, no início da guerra, um rublo em papel custava pouco mais de 0,25 rublo em prata.

Destruir o dinheiro falso

Durante a retirada da Rússia, Napoleão ordenou a destruição de todo o dinheiro falsificado que ainda não havia entrado em circulação. No entanto, uma enorme quantidade de notas já estava nas carteiras dos russos. Entre 1813 e 1817, o governo encontrou notas falsas no valor de mais de 5,5 milhões de rublos. No primeiro ano após a guerra, os bancos decidiram até aceitar o dinheiro falso francês.

"Mercado abarrotado em Moscou", de Vladímir Makóvski, 1880.

A taxa de câmbio dos rublos de papel continuou a cair: em 1815, um rublo em papel custava 0,2 rublo em prata. Assim, o governo russo percebeu o problema, e o ministro das Finanças, Dmítri Guriev, encontrou uma saída: ele sugeriu criar uma única empresa que teria o direito de imprimir dinheiro.

À dir., original; à esq., falsificação.

Assim, em 1818, por decreto do imperador Alexandre 1º, surgiu a Expedição para Impressão de Documentos do Estado, que começou a imprimir novas notas para todos os territórios do Império Russo. Foi esta medida que permitiu combater a inflação.

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