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Por que Nicolau 1º da Rússia foi apelidado de «gendarme da Europa»?
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O período do reinado de Nicolau 1° (1825-1855) é considerado complexo e contraditório. Este monarca entrou na história principalmente sob epítetos negativos. Nicolau é mais lembrado como um conservador cujo reinado foi marcado por uma grande expansão territorial, repressão de dissidentes, estagnação econômica, políticas ruins de administração, burocracia e guerras.
Como Nicolau ascendeu ao trono?
Nikolai (Nicolau) Pávlovitch Romanov era o terceiro filho do imperador Paulo 1º e o último na linha de sucessão ao trono. Assim, ele não estava sendo preparado para virar imperador e quase nunca se envolvia em problemas de Estado. Como outros grão-duques, ele recebeu uma excelente educação militar e, antes de ascender ao trono, foi comandante de diversas unidades da guarda real, ocupando o posto de engenheiro-chefe do exército russo.
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No entanto, em 1825, seu irmão mais velho, o imperador Alexandre 1º morreu repentinamente. O irmão do meio, Konstantin, estava, na época, em Varsóvia e se recusou terminantemente a assumir o trono — mas também a renunciar oficialmente a ele. Enquanto Konstantin hesitava, os militares e até o próprio Nicolau já haviam prestado juramento a Konstantin na capital.
No entanto, sob pressão da família e das elites, Nicolau decidiu mudar de posição, declarou-se imperador e marcou a posse para 14 de dezembro. Nesse dia, os revolucionários, junto com diversos militares, saíram para a Praça do Senado, em frente ao Palácio de Inverno, residência do imperador russo, para proteger os direitos de Konstantin e não permitir que Nicolau assumisse o trono.
O plano dos revolucionários, mais tarde chamados de “dezembristas”, fracassou, o exército não os apoiou, e a rebelião foi reprimida. Nicolau executou cinco instigadores da rebelião por enforcamento. Esse sangrento episódio marcou o início do reinado de Nicolau 1º.
Como Nicolau governou?
Nicolau 1º estava fortemente convencido de que a monarquia era a única forma de governo adequada à Rússia. Consequentemente, ele considerava desastrosas quaisquer mudanças liberais. Ele era um rígido conservador, sua política de Estado era descrita por historiadores por três postulados: autocracia, ortodoxia e nacionalidade.
“Nicolau tinha o objetivo de não mudar nada, não introduzir nada de novo, apenas manter a ordem existente, preencher as lacunas”, escreveu o historiador Vassíli Kliutchévski.
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Ele concentrou o governo do país em suas mãos e nas mãos dos ministros, a quem os funcionários públicos estavam totalmente subordinados, enquanto a sociedade foi excluída dos processos políticos.
Para saber como vivia a sociedade e controlá-la, ele criou um novo órgão, a Chancelaria Própria de Sua Majestade Imperial. O Terceiro Departamento dessa Chancelaria foi apelidado de “polícia secreta”, e vigiava “elementos não confiáveis”, censurava a literatura, os jornalistas e enviava relatórios regulares ao imperador.
Nicolau era uma pessoa religiosa e considerava que a revolta dezembrista mostrava seu “direito divino” ao trono. “Ele considerava o que tinha acontecido como a providência de Deus e resolveu que aquilo era um chamado do Senhor para combater a infestação revolucionária não apenas em seu próprio país, mas na Europa em geral: ele considerava a conspiração dezembrista parte de uma revolução pan-europeia”, escreveu o historiador Leonid Liáschenko. Essa confiança na ameaça revolucionária determinou a política externa de Nicolau 1º.
Gendarme da Europa
Nicolau 1º chegou ao trono convencido de que o Império Russo estava ameaçado por uma revolução organizada a partir dos países europeus. Ele acreditava que a Rússia tinha que manter paz e um poder forte na Europa. Assim, enquanto se iniciava uma revolução na Europa, o tsar considerava seu dever sagrado combatê-la e reagir rapidamente.
Em 1830, o exército russo reprimiu severamente a revolta polonesa contra as autoridades russas.
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Após a revolução na França em 1848, quando o rei Luís Filipe 1° foi derrubado e a Segunda República foi proclamada, os acontecimentos revolucionários da França se espalharam para outros países, como Itália e Áustria.
Uma semana após o levante francês, o imperador da Áustria, Francisco José 1º, pediu ajuda ao tsar russo contra o levante da Hungria, que poderia levar ao colapso do Império Austro-Húngaro e à formação de uma coalizão contra a Rússia.
Nicolau 1º ficou horrorizado com a situação, e, em 1849, enviou um enorme exército de 170 mil soldados e oficiais em socorro a Viena. Esta intervenção militar desempenhou um papel crucial na derrota dos húngaros por sua independência.
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Foi quando que a imprensa europeia começou a chamar o tsar russo de "gendarme da Europa". Mais tarde, na historiografia soviética, essa expressão seria associada à declaração de Vladímir Lênin de que, em 1849, a Rússia teve que desempenhar um papel de gendarme europeu — ele escreveu isso em um artigo de 1908 intitulado “Eventos nos Bálcãs e na Pérsia”.
De qualquer maneira, a revolução nunca cruzou as fronteiras do Império Russo. O regime de Nicolau 1º superestimou tanto suas próprias forças em outra guerra, aquela contra o Império Otomano entre 1853-1856, que isso o enfraqueceu. Nicolau 1º cometeu vários erros desastrosos e perdeu a guerra, minando a fé em seu regime — mesmo entre os conservadores mais leais.
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